quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Superlotação carcerária e violência policial preocupam no Brasil, diz ONG

O funcionamento dos sistemas carcerário e prisional brasileiros colocam o país num caminho tortuoso, que só deve resultar em mais violência e mais violações de direitos. Segundo relatório da ONG Human Rights Watch (HRW) para o Brasil, “problemas crônicos de direitos humanos continuam a prejudicar o sistema de justiça criminal brasileiro”.As principais preocupações da ONG são as mesmas do momento atual brasileiro, depois das chacinas ocorridas em presídios no último mês: “execuções extrajudiciais promovidas pela polícia, a superlotação de presídios, a tortura e maus-tratos de detentos”.

A HRW é uma organização não governamental com sede nos Estados Unidos, que milita em favor dos direitos humanos no mundo. As preocupações da entidade sobre o Brasil estão no capítulo dedicado ao país do seu Relatório Mundial 2017, lançado nesta quinta-feira (12/1).

Segundo o documento, a população carcerária brasileira aumentou 85% entre 2004 e 2014 e hoje conta com 622 mil presos. Isso significa que há 67% mais pessoas presas do que vagas no sistema penitenciário, diz a ONG, que se baseia nos relatórios do Sistema Integrado de Informação Penitenciária do Ministério da Justiça brasileiro, o Infopen.

“Superlotação e falta de agentes penitenciários e técnicos tornam impossível às autoridades prisionais manter o controle nos estabelecimentos prisionais, deixando detentos vulneráveis à violência e às atividades de facções criminosas”, diz o comunicado à imprensa sobre o estudo, também divulgado nesta quinta.

O relatório diz que a chamada Lei de Drogas, de 2006, foi um “fator-chave” para o aumento exponencial do número de pessoas presas. A lei mudou o tratamento para o crime de tráfico do Código Penal: criou as medidas cautelares para substituir prisões preventivas, acabou com a pena de prisão para usuários e aumentou a pena para o tráfico de drogas.

Para a ONG, a “linguagem vaga” da lei “possibilita que usuários sejam presos como traficantes”. E os números mostram que isso de fato aconteceu. Em 2005, 9% dos presos foram detidos por crimes relacionados ao tráfico. Em 2014, a cifra saltou para 28%. Entre as mulheres, a proporção é de 64%, sempre de acordo com os dados do Infopen, citados pela HRW.

Audiências de custódia
As audiências de custódia, implantadas no Brasil a partir de 2014, são consideradas um avanço pela ONG norte-americana. Elas obrigam a apresentação de todos os presos em flagrante a um juiz dentro do prazo de 24 horas, para que o magistrado decida sobre a manutenção daquela prisão ou sua conversão em medidas cautelares.

Mas há ressalvas. A ONG cita dados do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), que analisou 700 audiências de custódia feitas em São Paulo e constatou que os juízes só perguntaram aos detidos sobre o tratamento recebido pelos policiais em 40% dos casos. Houve denúncias de abusos em 141 casos, mas, segundo o IDDD, nenhuma providência foi tomada em um terço deles.

Repressão policial
O capítulo dedicado ao Brasil também mostra preocupação com a violência nas cidades, atribuída, pela HRW, a “facções criminosas”. Mas são “abusos cometidos pela polícia, incluindo execuções extrajudiciais” que “contribuem para um ciclo de violência com áreas de alta criminalidade, debilitando a segurança e colocando em risco a vida dos policiais”, segundo o estudo.

De acordo com dados da ONG brasileira Fórum Nacional de Segurança Pública citados pela HRW, policiais mataram 3.345 pessoas em 2015. Um aumento de 6% em relação a 2014 e de 52% em relação a 2013. “Embora algumas das mortes causadas pela polícia resultem do uso legítimo da força, outras são execuções extrajudiciais”, diz a pesquisa da Human Rights Watch.

Esses dados explicam por que a população brasileira não confia nem coopera com a polícia, diz a diretora da Human Rights Watch no Brasil, Maria Laura Canineu. “Fechar os olhos para a violência policial significa não apenas negar justiça às famílias das vítimas, como também afastar comunidades e colocar policiais que nela atuam em risco”, afirma.

Nenhum comentário:

Postar um comentário