Luís Francisco Carvalho Filho
"Quebrar o prestígio dos facínoras". A frase de Joaquim Nabuco sintetiza a política de combate à impunidade que seu pai, ministro da Justiça, empreendeu no Segundo Reinado. Importante o resultado: não era para ter "escrúpulo" de algum excesso que se pudesse cometer.
Duarte Coelho, donatário de Pernambuco, reclamava em 1546 das Capitanias que davam acolhimento aos fugitivos, livres do castigo por ele imposto. Regente Feijó, no discurso depois de eleito, prometia: "o governo será infatigável em promover a execução das leis penais".
O tempo passou, o país se transformou e o sentimento de impunidade permanece intenso, constrangedor.
Gente rica e influente não se sentava no banco dos réus. Era assim. O mandonismo persiste, mas a imprensa é mais vigorosa. Hoje, ricos e pobres frequentam o fórum criminal, ainda que a solução dos processos seja seletiva, racista, preguiçosa, temerária.
Um ministro do STF falou recentemente da desigualdade entre pobres e ricos, como se o problema estivesse na porta de entrada das prisões.
Ainda há segmentos intangíveis, mas a lista dos que, na expressão de Elio Gaspari, habitavam o andar de cima e conheceram o sistema penitenciário poderia preencher o espaço desta coluna. Médicos como Hosmany Ramos e Eugênio Chipkevitch, magistrados como Rocha Mattos e Nicolau dos Santos Neto, playboys como Doca Street ou meninos estúpidos, anônimos, que incendiaram sem teto ou assaltaram padarias, procuradores disso ou daquilo, empresários como PC Farias e Salvatore Cacciola, matadores de todos os gêneros.
Há algo errado no projeto punitivo brasileiro. O tratamento dos presos lembra a época da escravidão. A culpa é presumida. Os processos não se aproximam da verdade. Como ainda não há "escrúpulo" pelos abusos cometidos, a lei de execuções penais é solenemente ignorada.
A lista dos que não precisariam estar encarcerados (porque não são perigosos e poderiam ser punidos de outra maneira eficaz) ocuparia páginas deste jornal. E não falo de ricos.
Em dezembro de 2012, o Brasil tinha mais de 540 mil presos, cerca de 143 mil entre 18 e 24 anos de idade, estigmatizados para sempre. Cresceu vertiginosamente a quantidade de detentos por tráfico de entorpecentes: mais de 131 mil, muitos surpreendidos com pequenas porções de droga. Esforço inútil e caro.
Em contrapartida, o crime nas ruas corre solto. Só 5% dos casos registrados de roubo (crime praticado com violência ou grave ameaça) na capital paulista são investigados. Em julho de 2013, foram 11.382 Boletins de Ocorrência e apenas 564 inquéritos instaurados. O resto sumiu.
A insatisfação generalizada pode arrefecer um pouco com a prisão de alguém famoso. Mas tratar os ricos como são tratados os pobres resolve? Sinal de prosperidade? A diferença entre pobres e ricos está na inexistência de um serviço básico. Gente pobre que poderia estar solta está presa, a vida destruída, porque direito de defesa, aqui, é para inglês ver.
Para Nabuco, o "grande pensamento" era a repressão a todo custo. Hoje deveria ser um jeito de encarcerar o mínimo possível.
Duarte Coelho, donatário de Pernambuco, reclamava em 1546 das Capitanias que davam acolhimento aos fugitivos, livres do castigo por ele imposto. Regente Feijó, no discurso depois de eleito, prometia: "o governo será infatigável em promover a execução das leis penais".
O tempo passou, o país se transformou e o sentimento de impunidade permanece intenso, constrangedor.
Gente rica e influente não se sentava no banco dos réus. Era assim. O mandonismo persiste, mas a imprensa é mais vigorosa. Hoje, ricos e pobres frequentam o fórum criminal, ainda que a solução dos processos seja seletiva, racista, preguiçosa, temerária.
Um ministro do STF falou recentemente da desigualdade entre pobres e ricos, como se o problema estivesse na porta de entrada das prisões.
Ainda há segmentos intangíveis, mas a lista dos que, na expressão de Elio Gaspari, habitavam o andar de cima e conheceram o sistema penitenciário poderia preencher o espaço desta coluna. Médicos como Hosmany Ramos e Eugênio Chipkevitch, magistrados como Rocha Mattos e Nicolau dos Santos Neto, playboys como Doca Street ou meninos estúpidos, anônimos, que incendiaram sem teto ou assaltaram padarias, procuradores disso ou daquilo, empresários como PC Farias e Salvatore Cacciola, matadores de todos os gêneros.
Há algo errado no projeto punitivo brasileiro. O tratamento dos presos lembra a época da escravidão. A culpa é presumida. Os processos não se aproximam da verdade. Como ainda não há "escrúpulo" pelos abusos cometidos, a lei de execuções penais é solenemente ignorada.
A lista dos que não precisariam estar encarcerados (porque não são perigosos e poderiam ser punidos de outra maneira eficaz) ocuparia páginas deste jornal. E não falo de ricos.
Em dezembro de 2012, o Brasil tinha mais de 540 mil presos, cerca de 143 mil entre 18 e 24 anos de idade, estigmatizados para sempre. Cresceu vertiginosamente a quantidade de detentos por tráfico de entorpecentes: mais de 131 mil, muitos surpreendidos com pequenas porções de droga. Esforço inútil e caro.
Em contrapartida, o crime nas ruas corre solto. Só 5% dos casos registrados de roubo (crime praticado com violência ou grave ameaça) na capital paulista são investigados. Em julho de 2013, foram 11.382 Boletins de Ocorrência e apenas 564 inquéritos instaurados. O resto sumiu.
A insatisfação generalizada pode arrefecer um pouco com a prisão de alguém famoso. Mas tratar os ricos como são tratados os pobres resolve? Sinal de prosperidade? A diferença entre pobres e ricos está na inexistência de um serviço básico. Gente pobre que poderia estar solta está presa, a vida destruída, porque direito de defesa, aqui, é para inglês ver.
Para Nabuco, o "grande pensamento" era a repressão a todo custo. Hoje deveria ser um jeito de encarcerar o mínimo possível.
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