Bruno Lupion - estadão
Se houvesse a 'Copa do Mundo' da ética pública, que premiasse a nação
menos corrupta, o Brasil estaria em maus lençóis. Em 2011, o País perdeu quatro
posições no Índice de Percepção de Corrupção, desenvolvido pela ONG
Transparência Internacional: caiu do 69° para o 73° lugar, entre 182 países
pesquisados. Na escala de 0 a 10, levamos nota 3,8, bem abaixo de outros países
do continente. O Chile recebeu nota 7,2 e está no 22° lugar, e o Uruguai, com
nota 7, tem a 25° posição.
Para juristas e cientistas políticos reunidos no II Congresso contra a
Corrupção, que ocorre neste sábado, 17, na Câmara Municipal de São Paulo, é
ilusão acreditar que esse cenário será revertido enviando mais corruptos para a
cadeia - pois a chance de isso ocorrer, no Brasil, é mínima. O caminho para
reduzir a impunidade, segundo eles, é criar mecanismos de mediação e
conciliação entre acusados e Ministério Público (MP), aplicando penas
alternativas, como devolução do dinheiro desviado, perda dos direitos políticos
e proibição de sair do País.
"A Justiça brasileira não manda o rico preso. Se o juiz de baixo
manda prender, o do tribunal manda soltar. Não nos iludamos com o discurso do
cadeião", alertou o jurista Luiz Flávio Gomes, membro da Comissão de
Reforma do Código de Processo Penal. Ele se diz "descrente" com a
Justiça brasileira e afirma que só com soluções mais dinâmicas, como o acordo
entre acusação e acusado, será possível punir corruptos com rapidez e reduzir a
sensação de impunidade.
Esse modelo já é utilizado em países como os Estados Unidos, Itália e
Alemanha. Neles, a Promotoria, munida de provas da corrupção, pode chamar o
acusado para uma negociação com o objetivo de ressarcir os danos ao erário
público e aplicar uma pena alternativa. Se o corrupto concorda, os efeitos são
imediatos e o processo é extinto. O Brasil tem um mecanismo semelhante, chamado
"transação penal", mas só para crimes de menor potencial ofensivo,
com pena máxima inferior a dois anos. Para os juristas reunidos no Congresso,
esse caminho precisa ser ampliado.
Gomes cita como exemplo o julgamento do Mensalão, que tramita desde
2007 no Supremo Tribunal Federal e ainda não tem data para terminar. Dos
quarenta réus denunciados pelo Procurador Geral da República, Roberto Gurgel,
apenas um já cumpriu sua pena, beneficiado pela transação penal: o ex-secretário-geral
do PT Sílvio Pereira. Ele fechou um acordo com o MP pelo qual se comprometeu a
prestar 750 horas de serviço comunitário, se apresentar mensalmente perante um
juiz e informar a Justiça sobre viagens longas ou para fora do País. "Se
todos tivessem tido a possibilidade de acordo, pode ser que há seis anos todos
já estivessem punidos. E hoje estaríamos falando de outros mensalões",
disse Gomes.
A jurista Ada Pellegrini Grinover, em vídeo transmitido no Congresso,
reforçou a defesa dos acordos entre o Ministério Público e corruptos. "É
muito melhor que haja uma punição menor, que vai afetar de alguma forma a vida
e a personalidade daquele que aceita a pena, do que a impunidade que temos
hoje", disse.
A reforma do Código de Processo Penal, atualmente em trâmite no
Congresso Nacional, é uma "oportunidade de ouro" para incluir na lei
mecanismos mais céleres de combate à corrupção, segundo o promotor de Justiça
Roberto Tardelli. "Hoje não há vantagem para alguém confessar seu crime. Só
vamos conseguir agilizar os processos se dermos ao Ministério Público a
possibilidade de negociação", disse.
Movimento. O II Congresso
contra a Corrupção é realizado pelo movimento NASRUAS, deflagrado há um ano com
o objetivo de organizar passeatas no dia 7 de setembro de 2011 em diversas
cidades do País. Desde então, o movimento tem articulado entidades e ONGs que
trabalham com o tema da corrupção e organizado congressos com especialistas
para debater e definir propostas de atuação.
Para 2012, o NASRUAS definiu como prioridades a defesa da Lei da Ficha
Limpa, a pressão por maior celeridade no julgamento de casos de corrupção, a
defesa do voto aberto obrigatório no Congresso, o acompanhamento da evolução
patrimonial de gestores públicos e a inclusão da disciplina "Cidadania,
Ética e Ensino Político" na grade curricular do Ensino Médio.
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