segunda-feira, 30 de julho de 2012

Ela tem um amante. O que fazer?


Fico feliz quando meus conselhos sentimentais dão certo. Muito feliz, pois crente que a felicidade é mercadoria de varejo, nunca de atacado.
Não sei se vocês, meus incríveis 12 fiéis leitores, lembram. Nem eu me recordava direito.
O certo é que aconselhei, há séculos, um homem que penava horrores por causa de uma traição. Ele cumpriu à risca os meus conselhos e, pasme, a desalmada voltou.
Agora os dois vivem uma espécie de IPHAN do amor, restauraram a lua de mel e outras ruínas. Convidaram este faminto e sedento cronista (dá-me vinho que a vida é nada) para um jantar na casa deles. Foi lindo.
Repito, abaixo, o meu conselho, que serve, inclusive, para o arrasado rapaz do “Crepúsculo” e para outros que rastejam com suas dores amorosas.
***
O leitor aflito me escreve. Quer ajuda, conselhos, alguma filosofia de consolação, ombro, ouvidos… Invoco a Miss Corações Solitários que costuma fazer morada nesta pobre caveira envelhecida em barris de bálsamo.
Não posso deixá-lo a mascar o jiló do abandono. Está desconsolado, como o Sizenando de Rubem Braga, que viu a amada cair nos braços de um playboy. Um idiota que não sabia sequer uma palavra de esperanto.
A vida é triste, Sizenando, como soprou-lhe o cronista.
Com Amaro, chamemos assim o nosso ensaio de Bentinho, não foi diferente.
Quis o destino parafusar-lhe objetos pontiagudos à testa.
Sim, ela tem um amante. Daqueles amantes que se encontram à tarde, num intervalo qualquer, no recreio da vida chata.
Nem foi preciso contratar o detive particular, conta-me o nosso Amaro. Ele mesmo fez as vezes de cão farejador de sua própria desgraça.
Que fazer?, indaga, num email no qual até a arroba bóia em poças de lágrimas.
Mato o desgraçado?
Tiro a vida da desalmada?
Vou-me embora pra Tegucigalpa?
Salto mortal da ponte Buarque de Macedo?
Um trágico, esse rapaz. Como os de antigamente. Amaro é do tempo em que os homens coravam. Ainda tenho vergonha na cara, envaidece-se o próprio.
Sossega, Amaro.
O melhor que fazes, respondi ao marido em fúria, é sumir por uns dias, inventar uma viagem, e dar todo tempo do mundo ao infeliz desse amante.
Banalizar o amante, meu caro e bom Amaro.
Entendeste?
Deixar que eles durmam e acordem juntos. Que tenham seus problemas, que percam o luxo dos encontros fortuitos e vespertinos, que se esbaldem.
É necessário deixar a Bovary sentir o bafo matinal da rotina.
A vida dos amantes dura porque eles só vivem as surpresas e valorizam cada minuto do relógio que põem sobre a cabeceira daquele motel barato.
Nada mais cruel para o amante da tua mulher que presenteá-lo com o pão-com-manteiga do dia-a-dia. A rotina é o cavalo de tróia do amor.
Amaro, nada de violência ou besteiras desse naipe.
Ao amante, todas as chances do mundo. Ao amante aquela D.R., a famosa discussão de relação, em plena TPM.
Um amante nunca sabe o que venha ser uma mulher sob o domínio da TPM. Ela faz questão de reservar todos os direitos desse ciclo ao pobre marido.
Ao amante, Amaro, a tapioca fria e sem recheio da rotina do calendário.
Ao amante, Amaro, a falta de assunto.
Ao amante, os cabelos revoltos da mulher, naqueles dias em que nem mesmo ela se agüenta ou encara o espelho. Naqueles dias em que os cabelos brigam com as leis do cosmo e não há pente ou diabo que dê jeito.
Some, Amaro, depois me conta.

- Xico Sá

Nenhum comentário:

Postar um comentário